Os abraços, assim como qualquer outro contacto social, são importantes para a condição humana. O afeto e o contacto físico ajudam a reduzir o stress, acalmam o sistema nevoso e ajudam a controlar a ansiedade.
“Os seres humanos têm vias cerebrais dedicadas especificamente à deteção do toque afetuoso”, explica Johannes Eichstaedt, cientista e professor de psicologia da Universidade de Stanford. “É como se nossos sistemas biológicos comunicassem entre si e dissessem que estamos seguros, que somos amados e que não estamos sozinhos”.
Durante o período de confinamento assistimos a várias formas criativas de manter o contacto com os outros, principalmente com os entes mais queridos. Exemplo disso foi uma mulher, no Canadá, que criou a “luva do abraço” e conseguiu abraçar a sua mãe em segurança. Através do material plastificado, a avó e o neto também se puderam abraçar.
Apesar de esta ser uma forma bastante criativa de manter o contacto físico, existem outras medidas que podemos adotar para que o ato de abraçar o outro seja um gesto seguro. Linsey Marr, cientista no Instituto Politécnico e Universidade Estadual da Virgínia, conhecido como Virginia Tech, nos EUA, e uma das principais especialistas do mundo em transmissão de doenças, explicou ao The New YorkTimes os riscos da exposição viral durante um abraço.
Tendo como base modelos matemáticos de um estudo em Hong Kong, que demonstra como os vírus circulam, Marr conseguiu calcular o risco de exposição ao vírus durante um abraço e concluiu que a probabilidade de contágio é baixa.
A razão é a seguinte: não se sabe exatamente a quantidade de partículas que são necessárias para deixar outra pessoa infetada, mas as estimativas variam de 200 a 1000 cópias do vírus. O ato de tossir pode transportar de 5000 a 10000 cópias, mas a maioria destas partículas espalha-se pelo chão ou em superfícies próximas. Quando as pessoas estão próximas umas das outras, normalmente apenas 2% das partículas da tosse são inaladas pela outra pessoa. Mas destas, apenas 1% são realmente infeciosas. “Não sabemos que percentagem de partículas infecciosos são necessárias para deixar o outro doente – provavelmente mais de 1%”, explica Marr. “Se não falarmos ou tossirmos enquanto damos um abraço, o risco de contágio é muito baixo.”
Claro está que o mais seguro é manter o distanciamento e evitar os abraços, mas quando existe a necessidade de se abraçar existem certas precauções que é importante manter: usar máscara; dar abraços ao ar livre; tentar evitar tocar no corpo ou na roupa da outra pessoa com o rosto e a máscara; não abraçar alguém que esteja com tosse ou outros sintomas do vírus. Os especialistas, como Marr, ainda sugerem outras medidas:
Abraçar em direções opostas
Quando as pessoas se abraçam é importante que não o façam com as caras encostadas, isto é, devem ter as faces em direções opostas para que o ar da respiração das pessoas não se misture.
“Esta posição é a de maior risco, porque os rostos estão muito próximos”, explica Marr. “Quando a pessoa mais baixa olha para cima e quando expira, devido ao calor e à flutuabilidade, o ar desta viaja para a zona de respiração da pessoa mais alta. Se a pessoa mais alta está a olhar para baixo, existe a possibilidade de as respirações exaladas e inaladas se misturarem.”
Assim, para um abraço seguro, de corpo inteiro, vire o rosto em direções opostas, impedindo assim o contacto entre os ciclos de ar.
As crianças devem abraçar nos joelhos ou na cintura
Abraçar ao nível do joelho ou da cintura reduz o risco de exposição direta das gotículas porque os rostos estão distantes. Contudo, ainda existe probabilidade de o rosto ou a máscara da criança contaminarem as roupas do adulto, portanto, é importante trocar de roupa e lavar as mãos depois uma visita que inclui abraços. O adulto também deve desviar o olhar para não respirar para cima da criança.
Beijar as crianças na parte de trás da cabeça
Nesse cenário, o avô é exposto de forma mínima à respiração da criança. Contudo, a criança pode ser exposta à respiração da pessoa mais alta, pelo que o adulto deve fazer-se acompanhar de uma máscara enquanto beija a criança.
Julian Tang, virologista e professor da Universidade de Leicester, na Inglaterra, acrescenta mais uma medida que ajuda em tempos de pandemia: suster a respiração. “A maioria dos abraços dura menos de 10 segundos, então as pessoas devem ser capazes de o fazer”, disse Tang. “Depois, volte a separar-se pelo menos dois metros, antes de voltar a falar, para permitir que recuperem o fôlego a uma distância segura”.
Yuguo Li, professor de engenharia da Universidade de Hong Kong e autor do artigo que Marr citou para fazer os cálculos, disse que os abraços representam um menor risco de contágio do que uma conversa cara a cara. “O tempo de exposição é curto, ao contrário da conversa, que pode ser o tempo que quisermos”, disse ele. O professor indica que usar máscara é importante, assim como a lavagem das mãos, porque existe um baixo risco de contrair o vírus através das mãos, da pele ou da roupa de outra pessoa.
Marr alerta que o risco de dar abraços é muito baixo, mas não é de zero. Assim a cientista demonstra a importância de conter os abraços. “Eu abraçaria os amigos íntimos, mas pularia os abraços casuais”, disse Marr. “Eu adotaria a abordagem de Marie Kondo – o abraço deve despertar alegria.”