Agonismo e Antagonismo

Victor Tohmé
Mundo Molecular
Published in
7 min readAug 11, 2019

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Vamos aqui entender sobre as substâncias que se ligam e provocam respostas biológicas, como também substâncias que se ligam e atrapalham essas respostas.

Começaremos bem diretos: o agonista é a minha molécula (como estamos falando de farmacologia, essa molécula é o meu fármaco) que se liga a um receptor e estabiliza-o em determinada conformação (em geral uma conformação ativa), gerando uma resposta biológica. E o antagonista é uma molécula que é capaz de inibir a ação de um agonista, mas não exerce nenhum efeito na ausência deste. Em outras palavras: tenho o meu receptor biológico. Se o agonista se liga a ele, teremos algum efeito no corpo. Mas caso o antagonista se ligue na ausência do agonista, nenhuma resposta será provocada. Só que caso o agonista estiver no mesmo ambiente, o meu antagonista irá atrapalhar a atividade do primeiro.

Os Antagonistas

Observe a imagem abaixo. A partir dela conseguimos discutir todos os tipos de antagonismo que existem:

Antagonistas de receptores

São os que disputam o mesmo receptor biológico que o agonista.

Eles podem fazer ligação com o sítio ativo de uma enzima. Ou seja, as enzimas possuem uma região em sua estrutura que, quando ligada à algum substrato, fará com que a enzima fique ativa ou inativa. Essa região é o sítio ativo da minha enzima. Logo, um antagonista pode se ligar ao sítio ativo da minha enzima, competindo contra um agonista que se ligue a esse mesmo sítio ativo.

E aqui podemos ter os antagonistas competitivos, que vão disputar a região com um agonista, e quem estiver em maior quantidade vence. Já os antagonistas não competitivos serão aqueles que, uma vez ligados ao sítio ativo, vão interagir de tal forma e com tanta intensidade, que funcionarão como uma tampa: bloquearão permanentemente o sítio ativo daquele receptor.

Mas também temos os antagonistas que irão se ligar à uma região diferente do sítio ativo, a região alostérica. Isso porque a enzima tem a sua região principal (sítio ativo), e uma outra que também provocará um efeito (região alostérica). Nesse caso, o antagonista não vai competir pelo sítio ativo, mas vai se ligar ao sítio alostérico, atrapalhando a ação biológica provocada pelo meu agonista. Assim, ainda há uma briga pelo receptor biológico, mas em pontos diferentes.

Como aqui o antagonista não briga pelo sítio ativo e sim, pelo sítio alostérico (a região “alternativa” do meu receptor), ele acaba não sendo competitivo. Pode ser que se ligue de forma reversível ou irreversível, mas de qualquer jeito não vai disputar a região com nenhum agonista.

Veja essa foto que ilustra as regiões do meu receptor, no caso, uma enzima. Esta, em cinza, tem o sítio ativo de um lado que vai se ligar ao seu substrato. Já nas suas costas temos uma segunda região, o sítio alostérico onde, caso um inibidor se ligar ali (antagonista), deixará a enzima deficiente para se ligar ao substrato, como normalmente aconteceria.

Antagonistas sem receptores

Aqui o antagonista não estará mirando nenhum receptor biológico.

Podemos ter um antagonista químico que é aquele antagonista que ignora o receptor e vai interagir diretamente com o agonista e o resultado disso culmina em um agonista defeituoso, que não mais tem a capacidade de interagir com o receptor biológico.

Já o antagonista fisiológico é uma molécula que ao se ligar à um receptor biológico diferente do meu agonista, vai provocar uma resposta contrária. Por exemplo: o meu agonista se liga a um receptor do coração e provoca aumento da frequência cardíaca. Já meu antagonista fisiológico se liga a um receptor do coração diferente do primeiro e assim, provocará uma diminuição da frequência cardíaca.

Abaixo uma nova imagem que reforça um pouco dessa relação do receptor com os agonistas e antagonistas.

Análise gráfica — Relação de Antagonista e Agonista

Vamos agora entender o que foi falado analisando dois gráficos abaixo:

Gráfico A: no meu eixo X é a concentração, que vai aumentando da esquerda para a direita. Se eu colocar o meu antagonista sozinho (linha horizontal), junto com meu receptor biológico, o grau de resposta biológica (eixo Y) é zero. E se eu jogar somente meu agonista (primeira linha que sobe), teremos um outro comportamento, gerando resposta biológica. Agora repare que se jogarmos um antagonista com o agonista, teremos um terceiro comportamento, onde a curva acaba dando uma deslocada para a direita. Ou seja, conforme eu vou aumentando a concentração do meu agonista, eu vou conseguindo recuperar a resposta biológica que o meu antagonista estava impedindo. Finalmente eu consigo atingir o 100% de resposta, mas eu atinjo ela precisando de mais agonista para eu ter os mesmos 100% de resposta.

Analisando a quantidade de fármaco que preciso usar para gerar 50% de resposta, se só tiver agonista vou precisar de uma concentração X. Mas a partir do momento em que um antagonista estiver presente, vou precisar de Y, onde X é menor que Y.

Gráfico B: agora, com um antagonista não competitivo, não me interessa a quantidade de agonista. Pode ser mais, menos ou igual. Só que uma vez que o agonista estiver misturado com o antagonista, não conseguirei mais atingir minha resposta máxima, já que o antagonista brigará por um sítio alostérico, ao invés do sítio ativo do meu receptor.

Os Agonistas

São aqueles que se ligam e promovem o efeito biológico. Temos de dois tipos:

  1. Agonistas Plenos: vamos observar o gráfico A. O butil e o hexil, para um mesmo receptor biológico, terão respostas diferentes. O butil terá uma capacidade de provocar o seu efeito em menor quantidade se comparado ao hexil. Ambos conseguem atingir a máxima de resposta, mas preciso de menos butil para isso. Ambos são casos de agonistas plenos, pois conseguem atingir 100% da resposta em algum momento, não importa se preciso mais de um ou menos do outro.
  2. Agonistas parciais: agora, pro mesmo receptor, posso ter o heptil e o octil. Repare que eles também estarão atuando em meu receptor biológico, mas eles não conseguem atingir 100% da resposta. São casos de agonistas parciais: eles conseguem se ligar e provocar o efeito biológico, mas não com o máximo de resposta possível.

Agora vamos se atentar a esse gráfico B, com a morfina e a buprenorfina. Observe que a morfina vai conseguir atingir o meu máximo de resposta, sendo o agonista pleno e a buprenorfina o agonista parcial. Mas comparando a metade do máximo que cada uma consegue atingir, preciso de menos buprenorfina do que a morfina (ED50 da buprenorfina é menor que o ED50 da morfina). Isso tem a ver com potência e eficácia, um outro tópico que abordo em outro artigo.

  1. Agonista inverso: por ser um agonista, ele vai provocar um efeito quando se ligar. Imaginemos um receptor biológico que tem sua atividade sendo exercido. O agonista inverso é aquele que, ao se ligar à um receptor, provocará uma resposta inversa à usual daquele receptor. Se este provoca aumento da frequência cardíaca, o agonista inverso, quando se liga, vai provocar diminuição da frequência cardíaca, não porque compete com um agonista e sim, porque esse é o efeito que ele produz. Acaba tendo uma certa semelhança com o antagonista competitivo, mas se atente à definição: o antagonista não é capaz de gerar resposta.. O agonista, sim.

O que são receptores de reserva?

Quando o antagonista não competitivo está presente, não tem como atingirmos a resposta máxima usando meu agonista. Mas existe um grau de resposta no corpo que chamamos de receptores de reserva. Quando isso acontece, eu já consigo sustentar uma resposta do meu agonista. Observe o gráfico abaixo:

A primeira curva lá em cima é a presença apenas do meu agonista, onde este consegue atingir a resposta máxima. Só que se eu adiciono um pouco de antagonista, precisarei de mais agonista, mas percebe que ainda consigo atingir (pelo menos para as duas linhas abaixo) o 100% de resposta. Isso acontece porque no meu corpo tenho vários receptores espalhados pelo tecido, os receptores de reserva. Logo, posso ter 100 receptores espalhados. Para termos 100% de resposta, preciso de 50 deles ocupados por agonistas. Mesmo que 10 sejam “inutilizados” pela presença do meu antagonista, ainda tenho outras 90 opções de ligação para o meu agonista.

Mas a partir de um momento, conforme aumente a quantidade de antagonista não competitivo, não mais conseguirei atingir o meu 100%.

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